terça-feira, 27 de outubro de 2009

Cidades

Sentidos. Todos de extrema importância. Cegos dizem que enxergam com o coração. Surdos dizem que são especiais, pois escutam o barulho do silêncio. Cegos tocam em tudo para enxergar o mundo por meio do tato. Cegos apreendem tocando, cheirando e ouvindo. Surdos apreendem visualmente.
O olfato mexe com os outros sentidos. A memória olfativa transforma os sentidos em nostalgia.
E eu, sinto o cheiro das coisas, das pessoas, dos lugares e a cada olor, uma imagem se forma em minha mente.
Foram muitos os lugares por onde passei. Cidades grandes e cidades pequenas. Umas têm cheiro de paz, outras de angústia, outras de sufoco, nenhuma de felicidade. De algumas tenho vontade de voltar. Outras, que saiam do mapa de vez.
Cidades grandes têm cheiro de sangue quente correndo nas veias... de angústia crescendo no coração... de ansiedade descabida, desenfreada... de falta do eu...
Cidades pequenas têm cheiro de saudade, têm cheiro de aconchego, de encontro consigo mesmo.
Ah!!! Quanto aconchego tinha aquela em que vivi há mais de 30 anos. Pequena cidade no interior do Rio Grande do Sul, onde as pessoas se cumprimentam ao se encontrarem nas ruas. Combinam de tomar chimarrão à tardinha para por os “causos” em dia.
Gaúcho é gente de meditação. Um gaúcho que se preza senta, ou com a família, para trocar idéias e contar o que aconteceu ao final do dia, ou para tomar chimarrão sozinho, organizando os pensamentos para por em prática no dia seguinte.
Isso é que costumo fazer nesta cidade grande. Mas aquela tem cheiro de aconchego, de saudade, de paz encontrada a muito custo. Ela tem algo peculiar.... eu a conheci em plena adolescência.
Dessa cidade tenho saudade. Lá vivi muitas coisas, como as outras. Mas, sobretudo, vivi o primeiro amor, singelo e simples; daquele de comer jabuticaba na praça escondido do pai. Bobagem! Ele sempre chegava na hora errada.
Aquele que rouba flores no jardim alheio e que compra chocolate todos os dias, sem pensar que, no futuro, isso poderia não ter sido uma ideia saudável.
Aquele dos arrulhos, das conversas escondidas, dos cochichos, de ir à missa todos os domingos, só pra fazer “um grau” pra a família.
Aquele amor que conhece todos os cantos da cidade e que todos o conhecem: o padeiro, o leiteiro, o porteiro do cinema e a gente pensa que só os pais não sabem.
Esse amor vai crescendo e se tornando adulto, assim como a cidade. Tem mais ruas nessa cidade, tem mais casas nessa cidade, tem mais cidadãos nessa cidade, assim como o amor.
A cidade não é mais a mesma. O amor não é mais o mesmo. Outras cidades vieram no lugar dessa. Outros amores vieram no lugar desse. Mas, nenhuma com o cheiro dessa e nenhum com o aroma desse.
Cidades escondem amores! Amores escondem muitas cidades!

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